Afronautas é um termo criado por Edward Nkoloso, pai do programa espacial da Zâmbia, que se nunca saiu do chão, conseguiu fazer um país inteiro sonhar!
Quando a corrida espacial estava em sua infância, americanos e soviéticos foram surpreendidos com um terceiro participante, um azarão que ousou desafiar as grandes potências, colocando no mapa seu país e seus Afronautas: a Zâmbia.
Breve histórico
Quando estourou a Segunda Guerra Mundial, a Inglaterra foi buscar reforços em suas colônias e para convencer o pessoal a lutar pelo país que literalmente dominava sua terra-natal, o pessoal foi convencido de que ganhariam independência com o fim da guerra.
Obviamente os Aliados venceram e a Inglaterra tentou dar uma de joão-sem-braço, então percebeu que tinha um problema maior: milhares de tropas nas colônicas, desejosas de independência e com treinamento e experiência militar. Grupos rebeldes surgiram pra todo canto e um desses rebeldes treinados era um professor de ciências que se chamava Edward Makuka Nkoloso, mas apesar do nome não era parente do Kid Bengala.
Nascido em 1919 no norte da Rodésia, que mais tarde seria parte da Zâmbia, Nkoloso lutou pelo império britânico na Segunda Guerra Mundial e pela independência da Zâmbia, tendo sido preso por isso em 1956 e 1957, mas seu maior interesse era intelectual. Um de seus crimes foi construir uma escola.
Nessa época a Zâmbia só tinha seu orgulho nacional e Nkoloso acreditava no futuro do país, mais que qualquer um. Em 1960 ele fundou a Academia Nacional de Ciência, Pesquisa Espacial e Filosofia da Zâmbia, e anunciou que iria chegar na Lua antes dos americanos ou dos soviéticos.
Os primeiros Afronautas
Ele reuniu voluntários para seu corpo de afronautas e enquanto americanos nem cogitavam mandar mulheres ao espaço, a candidata escolhida para o primeiro voo do Programa Espacial da Zâmbia foi uma moça de 16 anos chamada Matha Mwambwa.
Em uma fazenda a 11 quilômetros da capital, os candidatos a afronautas treinava, fazendo exercícios diários, e rolando dentro de barris em declives. Como a Zâmbia não dispunha de um Cometa-Vômito, os candidatos simulavam gravidade zero em um balanço em uma árvore.
O lançamento estava previsto para 1964, celebrando a independência do país e o foguete se chamaria D-Kalu 1, em homenagem a David Kaunda, primeiro presidente da Zâmbia, mas os conservadores do governo acharam que lançar um foguete de dentro do estádio não se encaixaria com as tradições africanas.
Nesse meio-tempo Nkoloso ficou mais ambicioso ainda; enquanto a corrida espacial dos brancos mirava na Lua, ele agora queria mandar seu foguete para Marte, levando a Mwambwa, dois gatos treinados e um missionário para evangelizar os marcianos, que depois de muitas observações com seu telescópio, Nkoloso decidiu serem bem primitivos. Mas ele avisou: não deveriam forçar o cristianismo, os marcianos deveriam aceitar Jesus de livre e espontânea vontade.
Nkoloso tentou se candidatar prefeito de Lusaka, capital da Zâmbia, e seus planos envolviam encher a cidade de escolas, bibliotecas e centros de pesquisa, ele queria transformar a cidade em uma nova Nova York ou Paris, mas como qualquer candidato que promete investir em ciência e cultura, ele foi derrotado por algum populista.
Com verbas negadas pela UNESCO e sem conseguir investidores internacionais, o projeto foi minguando. Nkoloso alegou que seu foguete foi sabotado por forças externas (não ria falaram o mesmo do nosso), que espiões soviéticos e americanos rondavam seu Centro Espacial tentando roubar sua tecnologia, inclusive seus gatos treinados (a parte mais difícil de acreditar em toda a história).
Pra completar a moça que iria ser a primeira Afronauta não era mais moça; engravidou e os pais a proibiram de participar do programa espacial. Em 1969 com a chegada do Homem na Lua, os candidatos a afronautas acabaram abandonando o projeto, o Centro Espacial foi demolido e Nkoloso seguiu para outras aventuras, trabalhando em órgãos do governo, promovendo ciência e educação.
O Governo, como sempre, se distanciou do “programa espacial” quando percebeu que era motivo de piada, mas internamente Nkoloso era admirado como um sonhador, um homem que defendia ardentemente a ideia de que a Zâmbia poderia ser um grande país e seu povo não era inferior a nenhum outro.
Claro que os planos dele nunca dariam certo, claro que o foguete, que se parecia demais com um latão de óleo com 3 metros de comprimento e 2 metros de diâmetro, nunca chegaria em Marte “em alguns dias”, mas isso não importa. Nkoloso era um sujeito que ousou sonhar, enquanto todo mundo se arrastava de um dia até o outro, olhando pro chão, ele teve a coragem de olhar pra cima e sonhar com um mundo melhor para seu país.
Ele morreu em 1989, aos 70 anos, teve um funeral de chefe de Estado.
Edward Makuka Nkoloso nunca foi ao espaço, seu otimismo e seu conhecimento de professor de ensino médio não eram suficientes, mas ele conseguiu algo muito mais importante: serviu de inspiração e hoje ele ainda é lembrado com carinho.
Pessoalmente gosto de imaginar que quando a delegação africana chega na Estação Espacial, na magnífica abertura de Valerian e a Cidade dos Mil Planetas, eles viajaram na SS Edward Nkoloso.