De ‘Maria vai com as outras’ a ‘dor de cotovelo’: a origem de 11 expressões famosas
Entenda como surgiram algumas das expressões que marcam gerações
1. Maria vai com as outras
De acordo com o pesquisador Brasil Gerson, autor de História das Ruas do Rio, a expressão tem origem no início do século 19, com a vinda da família real portuguesa para o Rio de Janeiro. A mãe do rei João VI, a rainha Maria I, costumava passear às margens do rio Carioca, no antigo bairro de Águas Férreas.
Acontece que Maria I era conhecida por sua insanidade mental (manifestada após a morte do filho e da Revolução Francesa), tanto que era tratada como “A Louca”. Como ela ia passear levada pelas mãos de suas damas de companhia, o povo dizia: “Maria vai com as outras”.
2. A cobra vai fumar
Surgiu como slogan da Força Expedicionária Brasileira, constituída em 1943 para lutar na Europa, durante a Segunda Guerra. Era uma resposta à descrente opinião pública da época, que dizia que era mais fácil uma cobra fumar do que o Brasil entrar na guerra.
A partida para a Itália só ocorreu em junho de 1944. Mas o ceticismo pairava no ar desde 1942, quando o presidente Getúlio Vargas anunciou que o Brasil não se limitaria ao fornecimento de materiais nem à expedição de contingentes simbólicos. Além de adotar o irônico slogan, a FEB editou um periódico que se chamava …E a Cobra Fumou!
3. Quebrar o galho
Quando alguém nos ajuda a resolver um problema, dizemos que essa pessoa nos “quebrou um galho”. Existem duas versões diferentes para explicar a origem desse regionalismo tão usado no Brasil.
Um dos significados da palavra galho é “conjunto de riachos que se reúnem para formar um rio”. Assim, para os viajantes, “quebrar um galho” significa abrir um caminho em um afluente de rio para desembocar de forma mais rápida no rio principal.
4. Dor de cotovelo
A expressão, incorporada pelos dicionários de língua portuguesa, se difundiu graças ao sambista Lupicínio Rodrigues. Lupe, como era conhecido, foi um mulherengo incorrigível. Usou suas diversas desilusões amorosas como inspiração para compor.
Ele costumava classificar sua dor de cotovelo em três categorias, conforme a intensidade: a federal, que sempre acabava em um porre; a estadual, suportável; e a municipal, que não rendia sequer um samba. Praticamente todos os sambas de Lupe mencionavam a ‘dor’.
5. Enfiar o pé na jaca
Não é nenhum segredo, enfiar o pé na jaca quer dizer tomar uma carraspana, ficar de pileque, ser um borrachão. Ainda que em algum lugar alguém deva ter enfiado o pé na grudenta e descomunal fruta, a origem da expressão não tem nada a ver com algo que você possa comprar na feira livre.
Originalmente era ‘‘enfiar o pé no jacá”, com acento. Jacá vem tupi aya’ka e era um cesto feito de bambu ou cipó. Ele era usado preso no lombo de animais de transporte de carga no Brasil colonial, entre os séculos 17 e 18.
Em suas viagens, quando os tropeiros paravam em bodegas de beira de estrada e exageravam na bebida. Na hora de subir de volta no burrico, quem saía trançando as pernas podia enfiar o pé no jacá, passando o maior vejame, ultraje, opróbrio, carão.
6. Com os burros n’água
Designada quando alguém faz esforço para conseguir algo e se dá mal, a frase vem dos tempos do Brasil colonial, que, entre os séculos 17 e 18, viu a necessidade de escoar ouro, cacau e café entre o Sul e o Sudeste e adotou a ideia dos colonizadores espanhóis, que transportavam entre Potosí (Bolívia) e Porto Belo (Panamá) cargas sobre burros ou mulas.
Era comum os condutores das tropas enfrentarem caminhos torturantes. Muitas vezes davam, literalmente, com os burros n’água — em travessias alagadas onde os animais morriam afogados. Como o dono da mercadoria arcava com o dano, a expressão passou a ser empregada sempre que alguém leva a pior.
7. As paredes tem ouvido
Tanto ocidentais quanto orientais concordam com a expressão que alerta para os perigos de sermos escutados sem saber. O dito existe, nessa mesma forma, em línguas como alemão, francês e chinês. Sua origem remonta a um antigo provérbio persa que dizia: “As paredes têm ratos, e ratos têm ouvidos”.
Um dos primeiros registros de provérbio semelhante em inglês aparece no clássico medieval The Canterbury Tales, escrito por Geoffrey Saucer entre 1387 e 1400. Saucer descreve algo como “aquele campo tinha olhos, e a madeira tinha ouvidos” em um dos contos.
A expressão ganhou um sentido quase literal, que pode ser testemunhado até hoje em castelos medievais e, principalmente, palácios renascentistas. Muitos deles – como o Palácio dos Doges, em Veneza, Itália – escondem dutos e aberturas pelas paredes, construídas na época para possibilitar a audição, em outras salas, de encontros políticos a portas fechadas.
8. Fazer uma vaquinha
O ato de juntar algumas pessoas para coletar um dinheirinho passou a ser conhecido como “fazer uma vaquinha” no século 20 por causa do futebol. Nas décadas de 20 e 30, quase nenhum jogador de futebol ganhava salário – luxo só garantido aos atletas do Vasco da Gama.
Nesses tempos bicudos, muitas vezes a própria torcida reunia-se a fim de arrecadar, entre si, um “prêmio” para agraciar os craques. A grana era paga de acordo com o resultado obtido em campo. Os valores dessas “bolsas” associavam-se aos números do jogo do bicho, loteria criada nos fins do Império.
Se arrecadassem 5 mil réis, por exemplo, chamavam o prêmio de “um cachorro”, já que 5 é o número do cachorro no jogo. Dez-mil réis eram “um coelho”. Quinze mil réis, “um jacaré”. Vinte mil, “um peru”. Vinte e cinco mil, o prêmio máximo, era chamado de “uma vaca”. Nascia a expressão “fazer uma vaquinha”.
9. Arranca-rabo
Sinônimo de briga, confusão, escândalo, a expressão tem origem em Portugal. Mas os fatos que a inspiraram remontam às guerras da Antiguidade. Os guerreiros egípcios adotaram a prática de decepar a cauda dos cavalos das montarias inimigas para provar aos súditos a vitória em uma batalha.
“Um oficial do faraó Tutmés III (1504-1450 a.C.) chegou a registrar em suas escrituras a glória de ter arrancado o rabo do cavalo do rei adversário”, escreve ele no livro De Onde Vêm as Palavras.
O apreço pelo troféu inusitado durou milênios, chegando às terras lusitanas e, depois, ao Brasil. Aqui, os cangaceiros cortavam o rabo do gado de fazendas, para humilhar seus proprietários durante as invasões.
10. Segurar vela
Quando não existiam as lâmpadas – que podiam ser alimentadas por óleo de baleia ou gás –, as velas eram a principal fonte de luz. Por isso, na Idade Média, os iniciantes em todo tipo de trabalho braçal seguravam velas para que os mais experientes enxergassem o que faziam. Em teatros e outros lugares que funcionavam à noite, por exemplo, havia garotos acendedores de vela.
Em francês, uma das explicações da expressão (“tenir la chandelle”) se refere a criados que eram obrigados a segurar os candeeiros durante as relações sexuais de seus patrões e se manter virados de costas para não ver o que acontecia.
Entre 1500 e 1600, “segurar vela” passou a significar “ajudar em uma posição subordinada, desconfortável”. Com o tempo, serviu para designar a amante de um triângulo amoroso, e, mais recentemente, o amigo solteiro que acompanha um casal.
11. Conto do vigário
Conto do vigário é uma expressão usada em Portugal e no Brasil significando uma história elaborada com o objetivo de burlar alguém.
São várias as versões da origem do termo conto do vigário, mas o que todas guardam em comum é que tem como tema principal um golpe de esperteza e um vigário.
Uma das histórias mais conhecidas teria como palco, ainda no século XVIII, uma disputa entre os vigários das paróquias de Pilar e da Conceição em Ouro Preto, pela mesma imagem de Nossa Senhora. Um dos vigários teria proposto que amarrassem a santa ao burro que estava solto na rua. Pelo plano, o animal seria solto entre as duas igrejas. A paróquia para a qual o burro se encaminhasse ficaria com a imagem. O animal foi para a igreja de Pilar, que assim ganhou a disputa. Mais tarde teria sido descoberto que o burro era do vigário dessa igreja.
Outra versão reza que bandidos tentavam tomar dinheiro de incautos usando a história de uma herança que teriam ganho de um vigário ou por terem escutado uma história contada por um vigário, mas que para isso teriam que pagar várias taxas e outras quantias.[2]