O projeto Patronos foi criado para identificar e capacitar candidatos militares, que prometem ir com força para o pleito deste ano
Conhecidos pela rigidez na postura e apreço pela disciplina e hierarquia, os militares sempre tiveram um papel de destaque na história política do Brasil. Em algumas épocas mais, outras menos, fardados ou não, os representantes das forças armadas têm a presença notada nos mais variados nichos da gestão pública. Com a eleição de Jair Bolsonaro como presidente da República, a figura do militar ganhou formas incomparavelmente maiores. Bolsonaro, que inclusive é capitão da reserva, tem nos militares a sua maior força e confiança e isso é refletido em números.
Conforme um levantamento feito pela CNN Brasil junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) em julho deste ano, 6.157 militares ocupam diversos cargos no Poder Executivo. No final da gestão Temer, o número de militares em cargos no Executivo era de 2.765. Já no primeiro ano do governo Bolsonaro, esse número subiu para 3.515. O aumento expressivo do número de militares no governo federal este ano é explicado pela contratação de militares para atuar no Instituto Nacional do Seguro Social, o INSS, em um contrato que vai até 31 de dezembro e que pode ser prorrogado.
Em Goiás, a presença dos militares na política também é sentida. As eleições municipais que elegerão os novos prefeitos e vereadores dos municípios goianos estão previstas para acontecer em novembro deste ano e o número de militares que já manifestaram interesse em concorrer não para de crescer. Serão soldados, majores, tenentes, coronéis, cabos e até comandantes da Aeronáutica dispostos a tentar uma vaga no Executivo ou Legislativo.
O Projeto Patronos
A novidade é que, desta vez, os fardados pretendem entrar na política de forma planejada e estratégica. Os militares que pretendem se candidatar nestas eleições estão recebendo treinamento de um projeto instituído no âmbito da Associação dos Subtenentes e Sargentos do estado de Goiás (Assego), o Patronos.
Conforme a Assego, o projeto nasceu com o “objetivo de identificar, selecionar, capacitar e impulsionar policiais militares e simpatizantes para a disputa eleitoral de 2020” e existe “pela necessidade de representatividade sólida; pelo problema da pulverização de candidaturas; do amadorismo e falta de condições técnicas dos candidatos e pela ausência de planejamento político em longo prazo que, consequentemente, causam o enfraquecimento político dos militares”.
O Major Tarley, um dos responsáveis pelo projeto e líder do Renova Goiás, explica que várias candidaturas militares nasciam, às vezes, com falta de condições técnicas, o que causava o enfraquecimento político dos candidatos. “Nossa intenção é fazer com que a gente tenha novos nomes e novas práticas políticas. E de certa forma, concorrer com o sistema imposto”, conta. Para o major, o Projeto Patronos vem para “quebrar paradigmas”.
De acordo com o relatório do projeto do projeto e apuração feita pela reportagem do Jornal Opção, Goiás tem, até agora, 23 pré-candidatos militares a prefeituras e 41 a câmaras municipais.
Os que pretendem concorrer ao cargo do Executivo são:
Sgt. Ribeiro (PRTB) – Alto Horizonte
Sgt. Nunes (PSL) – Niquelândia
Sgt. Belair de Sousa (vice) (PP) – Cachoeira Dourada
Sgt. Luiz Carlos – Faina
Sgt. Bueno Hernany (SD) – Formosa
Cap. Cícero Jacinto (PRTB) – Formosa
Sd. Caetano (PDT) – Formosa
Cel. Marcelo Ranulfo (PV) – Caturaí
Cel. Antonio José Ferreira (PP) – Valparaíso
Ten. Edimar José Ferreira – Morro Agudo de Goiás
Cb. Vilmar Queiroz (PTC) – Minaçu
Sgt. Claude (MDB) – Porangatu
Maj. Eldecírio (PDT) – São Luís de Montes Belos
Ten. Joel – Iporá
Sd. Naldim Magalhães (SD) – Alexânia
Ten. Alessandro (Pode) – Abadiânia
St. Castro (PRTB) – Águas Lindas
Sgt. Paulo César – Pires do Rio
Cb. Glaciel (PSL) – Cachoeira Dourada
Cmdt. Bragança (Republicanos) – Anápolis
Cel. Belelli (PSL) – Caldas Novas
Ten. Cel. Rosendo (PSL) – Morrinhos
Maj. Araújo (PSL) – Goiânia
Conforme registrado pelo Projeto Patronos, há pré-candidatos a vereador nos municípios de Goiânia, Aparecida de Goiânia, Caldas Novas, Ceres, Inaciolândia, Fazenda Nova, Santo Antônio de Goiás, Aruanã, Rio Verde, Araguapaz, Guarani de Goiás, Nerópolis, Posse, Iporá, Jussara, Caturaí, Luziânia, São João da Aliança, Goianira, Vicentinópolis e Santa Fé de Goiás.
“Agora é a chance do militar se eleger”, diz sargento
Pré-candidato à Prefeitura de Alto Horizonte, no interior de Goiás, o Sargento Ribeiro (PRTB) avalia que o momento não poderia ser mais vantajoso para a figura militar. De acordo com o pré-candidato, os representantes das forças armadas têm podido contar com amplo apoio da população para ingressas na vida pública.
O militar tem quase 20 anos de corporação (ingressou em 2002). Em 2018, Ribeiro assumiu a missão de ser um dos coordenadores da campanha de Bolsonaro no Norte do Estado. A experiência parece tê-lo colocado mais próximo da política.
“Muitos militares têm abraçado essa causa [politica}. Eu vejo que o momento, não só da PM, mas das forças de segurança, é agora. A chance de eleger, de ter um apoio maior da população é nessa eleição. Com a popularidade do Bolsonaro voltando a subir, isso fortalece mais ainda nossas chances no pleito”, afirma.
Já para o Cabo Glaciel (PSL), pré-candidato à Prefeitura de Cachoeira Dourada, “onde há militares, há mais confiança da população. Segundo o cabo, o aumento da popularidade dos militares, principalmente no meio político, se deve à postura “mais transparente e à lisura em relação ao dinheiro público”.
Glaciel cita, como exemplo de êxito da disciplina militar, os colégios geridos pela corporação. Atualmente, segundo o portal dos Colégios Estaduais da Polícia Militar de Goiás, o Estado conta com 60 unidades escolares nesses moldes. “A gente vê o próprio modelo da educação nas escolas militares, que tem tido um sucesso enorme. Então é baseado nisso que esse será o pleito de maior sucesso para os militares”, garante.
Para pré-candidato à Prefeitura de Goiânia, militares sofrem pressão para não entrarem na política
Com 54 anos de idade e 34 de carreira militar, o deputado estadual Major Araújo, do PSL, tem uma vasta experiência nas Forças Armadas. O parlamentar, que está em seu terceiro mandato, conta que se alistou pela primeira vez quando tinha 20 anos e, a partir de então, passou a galgar patentes até chegar a major. Porém, Araújo diz acreditar que o cenário nunca foi fácil para o militar na ativa que decide ingressar no meio político.
Segundo o deputado, o militar que resolve se candidatar fica mal visto dentro da instituição e pode ser ainda mais prejudicado se lançar seu nome em um partido de oposição ao governo. “Se ele sair contra o partido do governador, lascou. É muita perseguição, transfere, inviabiliza a vida familiar do cara. Eu fui vítima disso”, conta.
Outro empecilho que, segundo o major, também faz com que o militar que tenha intenções políticas desista de sua candidatura, é o fato de ter sua promoção atrasada ou mesmo inviabilizada em razão do pleito. O deputado explica que, “de uns tempos pra cá, estão reclassificando o militar”. “Se ele for candidato, ele perde o lugar dele na fila para a promoção”, revela.
Apesar disso, o deputado diz que acredita que muitos militares podem ser eleitos nestas eleições, uma vez que, segundo ele, o perfil militar tem todas as atribuições valorizadas pela sociedade. Araújo também classifica a eleição de Jair Bolsonaro como um reflexo dessa afeição da população pelos militares.
“É um segmento bem visto pela sociedade. Não é fruto do momento, é fruto do próprio trabalho do militar. O militar tem uma presença firme, repassa uma imagem de austeridade, de coragem em tomar decisões, de firmeza. A sociedade espera isso. A própria eleição do Bolsonaro veio em virtude disso, com discurso e proposta fortes de combate à corrupção”, avalia.
Para Araújo, os militares deixam de ser eleitos pelo que ele chama de “falta de audácia”. Porém, a vitória do presidente da República em 2018, segundo ele, pode ter mudado esse quadro. “O efeito Bolsonaro ajuda. A chance é grande de eleger muitos militares. Nós já tivemos mais de 70 vereadores espalhados pelo estado. O numero de candidaturas girava, normalmente, em torno de 300, mas a gente nunca elegeu mais por falta de audácia pra se candidatar. Mas recentemente o pessoal está mais audacioso, principalmente para candidaturas majoritárias”, relata.