Proposta é alugar 80 mil imóveis desabitados para pessoas em situação de vulnerabilidade; vítimas de violência doméstica terão prioridade
Uma das principais políticas públicas para reduzir o déficit habitacional no Distrito Federal será disponibilizada para consulta popular nesta primeira quinzena de novembro. O Plano Distrital de Habitação de Interesse Social prevê a locação social, proposta que permite o aluguel, pelo Governo do Distrito Federal (GDF), de imóveis inabitados para população em situação de vulnerabilidade, mulheres vítimas de violência doméstica e pessoas em situação de rua com saúde mental debilitada.
O DF registra um déficit habitacional de 102.984 residências, o que representa 11,66% do total de domicílios da capital. Os dados fazem parte de uma pesquisa da Companhia de Planejamento (Codeplan) realizada entre 2019 e 2020, a pedido da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Seduh) para os estudos técnicos do plano.
Nesse cálculo entram quatro categorias de moradia: a coabitação, o adensamento, as residências precárias e o ônus excessivo para custeio de aluguel. No primeiro caso, estão os adultos que se casam, mas continuam vivendo com os pais ou avós, em 11 mil domicílios. No segundo, os lotes de habitação unifamiliar com quatro ou cinco moradias, que são 11,8 mil.
Pessoas que gastam muito mais de 30% da renda na despesa com moradia, o que representa 56 mil domicílios, formam a maioria do déficit habitacional no DFAs residências precárias são as casas mal construídas, sem condições mínimas de infraestrutura, que somam 30 mil domicílios. E o último caso, que equivale à maioria do déficit, inclui as pessoas que gastam muito mais de 30% da renda na despesa com moradia, representando 56 mil domicílios.
Imóveis inabitados
E se por um lado faltam moradias, por outro sobram imóveis com infraestrutura desocupados. Levantamento da Companhia de Saneamento Ambiental (Caesb) de 2016 aponta que a vacância imobiliária no DF é de 6,37% de unidades imobiliárias, o que corresponde a 79.908 com ligações de água inativas. Desse total, 41.027 são residenciais, 35.240 comerciais, 2.298 institucionais e 1.343 industriais sem atividade.
É neste cenário que surge a proposta de locação social destinada à população com renda familiar de até três salários mínimos. Nele, o proprietário que tiver interesse em disponibilizar um imóvel fechado para locação social poderá firmar um contrato com a Companhia de Desenvolvimento Habitacional do DF (Codhab-DF), que subsidiará parte do aluguel do inquilino.
“É bom para quem tem imóvel fechado, que passa a receber aluguel, sem risco de inadimplência e, para as famílias beneficiadas, que teriam acesso a moradia em locais com infraestrutura, comércio e serviços”Giselle Moll, secretária executiva de Planejamento e PreservaçãoPara evitar riscos de inadimplência, será criado um Fundo Garantidor que garantirá o pagamento do aluguel. Para participar do programa a família precisa estar inscrita na Codhab. “É mais um instrumento do GDF de minimizar o sofrimento a que essas pessoas estão submetidas, principalmente as que aguardam as etapas dos programas habitacionais e estão morando de favor ou encarando um aluguel que não dão conta de pagar”, explica o presidente da companhia, Wellington Luiz.
Ainda não há definição sobre valores, já que a proposta necessita de regulamentação, mas as diretrizes firmadas no Plano Distrital de Interesse Social criam cinco faixas de renda. A maior delas é entre 2,5 e 3 salários mínimos. O beneficiário que se enquadre nessa categoria terá um subsídio do governo menor, desde que o comprometimento com a despesa de aluguel não ultrapasse 25% da renda familiar.
De acordo com a secretária executiva de Planejamento e Preservação, Giselle Moll, a locação social é um dos programas que melhor deve atender à população de extrema vulnerabilidade. “É bom para quem tem um imóvel fechado, que passa a receber um aluguel, sem risco de inadimplência e, também, para as famílias beneficiadas, que teriam acesso a moradia em locais com infraestrutura, comércio e serviços.”
79.908imóveis no DF estão com ligações de água inativas, segundo a Caesb. Ou seja, desabitadas ou sem usoPartindo do princípio de que uma boa política habitacional oferece acesso à cidade e a uma rede de proteção social, o plano desenvolveu linhas de ação para atender pessoas de baixa renda com diferentes vulnerabilidades, como as vítimas de violência doméstica.
Só em 2020, de acordo com a Codeplan, foram aproximadamente 16 mil casos de violência doméstica registrados no DF. No primeiro semestre de 2021 esse número chegou a 7.869 casos. Para esse público foi criado um programa de provimento habitacional denominado Moravida, destinado a mulheres com renda de zero a cinco salários mínimos, que sofreram abusos e estão em risco de morte.
No Moravida, as mulheres vítimas de violência com vulnerabilidade comprovada vão para o primeiro lugar da fila de habitação de interesse social. Se tiver renda, tem que contribuir com o percentual do aluguel. Se não tiver, vai ser direcionada para programas de autonomia socioeconômica e capacitação.
“Temos que ter cuidado em manter o sigilo sobre essas pessoas e não colocá-las em um único edifício ou quadra para preservá-las. Evitar um olhar estigmatizante sobre determinado lugar é muito importante”Giselle Moll, secretária executiva de Planejamento e PreservaçãoAutonomia e dignidade
Secretária da Mulher, Éricka Filippelli lembra que, muitas vezes, as vítimas não conseguem romper o ciclo de violência dentro de casa porque dependentes financeiramente dos seus agressores, não têm para onde ir ou levar seus filhos. “E essa é mais uma ferramenta criada pelo governo para garantir a elas mais dignidade e autonomia na reconstrução de suas histórias.”
Outra linha de ação igualmente importante é o Moradia Primeiro. Foi pensado para oferecer habitação a pessoas em situação de rua com saúde mental debilitada ou agravada e para famílias com renda de até três salários mínimos que tenham integrantes nessa condição especial. O programa é estruturado em três componentes que devem ser ofertados de forma simultânea: moradia digna, acompanhamento socioassistencial e atenção psicossocial aos beneficiários.
“Nós apenas temos que ter cuidado em manter o sigilo sobre essas pessoas e não colocá-las em um único edifício ou quadra para preservá-las. Evitar um olhar estigmatizante sobre determinado lugar é muito importante” explica Giselle Moll.
Os programas Moradia Primeiro e Moravida precisam ser regulamentados e requerem integração de ações entre vários órgãos do governo, como as secretarias de Saúde, de Trabalho, de Desenvolvimento Social, da Mulher, de Desenvolvimento Urbano e Habitação e a Codhab, que será a grande executora do Plano Distrital de Habitação Interesse Social.
Rosualdo Rodrigues, Agência Brasília