Requerido pelo deputado Reginaldo Sardinha (Avante), debate reuniu, além de parlamentares, representantes da Adasa e consumidores de várias regiões
Mario Espinheira – Núcleo de Jornalismo – Câmara Legislativa
O aumento nas contas de água após a implantação de nova estrutura de tarifação pela Caesb foi discutido em audiência pública remota da Câmara Legislativa, na noite desta quinta-feira (22). O deputado Reginaldo Sardinha (Avante), autor da iniciativa, afirmou que seu gabinete “vem recebendo denúncias de cobranças abusivas” em consequência da Lei Distrital 6.272/2019 que extinguiu a taxa de consumo mínimo mensal de dez metros cúbicos, medida em vigor desde junho passado.
Conforme o presidente da Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal (Adasa), Jorge Werneck, o fim dessa maneira de tarifar “corrige uma injustiça social” e incentiva a economia de água. “Quem consumia um metro cúbico pagava o mesmo valor de quem consumia dez”, argumentou. Segundo ele, os mais pobres estavam subsidiando os ricos e a mudança permite que as famílias contempladas com a tarifa social passem de 2 mil para 80 mil. O novo modelo, porém, resultaria em perda de R$ 200 milhões anuais para a Caesb. “Existe a necessidade de manutenção de equilíbrio financeiro das prestadoras de serviço. Tivemos de fazer ajustes, senão haveria um aumento linear de 15% para todos os usuários”, explicou.
No entanto, de acordo com Werneck, 77% dos usuários do DF tiveram reajuste inferior ao índice e grande parte do aumento registrado no Lago Norte, uma das regiões com mais reclamações, foi consequência da ampliação do consumo no período da seca: “Seguimos a premissa de economia e de que quem consome mais deve pagar mais, até porque há uma relação direta entre renda e consumo de água”. Ele ressaltou que a mudança tarifária ocorreu após dois anos de “um estudo completo e moderno”, com expressiva participação de instituições.
Para o superintendente de Estudos Econômicos e Fiscalização Financeira da Adasa, Diogo Ferreira, a nova tarifa é socialmente mais justa, incentiva a economia de água e facilita o acesso dos mais pobres aos serviços. Conforme listou, as regiões que registraram maior aumento foram Lago Sul, Park Way e Lago Norte, enquanto as de maior redução foram Estrutural, Riacho Fundo II e Paranoá. Ele acrescentou que os mais ricos comprometem, em média, 0,5% da renda com água e esgoto enquanto os mais pobres, 5%. “Já registramos menor inadimplência nas regiões administrativas de menor renda”, ressaltou. Na faixa de até sete metros cúbicos, que representa 35% da população, houve redução média de 41,19% nas contas; para os que gastam mais de 45 metros cúbicos (cerca de 1% da população), houve aumento de 43,23%.
O presidente do Sindicato dos Condomínios do Distrito Federal, Antônio Carlos de Paiva, afirmou que concorda com a redução da tarifa mínima, mas que a Caesb precisa ser mais eficiente, gastar menos com pessoal e realizar mais investimentos. “Alguém precisa indicar à companhia que é necessário reduzir os seus custos. Talvez a saída seja a privatização”, defendeu. Ele também criticou o momento em que houve a mudança tarifária: “Os síndicos estão sem condições de convocar assembleias por causa da pandemia e os condomínios, sem dinheiro para pagar suas contas”.
Prefeito da Península Norte, Cláudio Luís Viegas reprovou o serviçosda Caesb e sugeriu que o Governo do Distrito Federal estabeleça subsídios para não sobrecarregar a população. Por sua vez, o diretor da Associação de Moradores de Águas Claras, Rodolfo Rodrigues, disse que a mudança “veio acompanhada de uma série de erros” e não contempla, na prática, as famílias mais pobres. Ele frisou que cada “puxadinho” em um lote é tarifado separadamente e que há famílias que não podem pagar nem R$ 16,00. Rodrigues defendeu que o GDF “arque” com os custos da tarifa social. Sobre a sugestão, Diogo Ferreira, da Adasa, observou que esse custo é de aproximadamente R$ 2,00 por residência.
Contas de até R$ 30 mil
Especialista em recursos hídricos e representante do Lago Norte na audiência pública, Jorge Pimentel Filho citou que há registros de contas de R$ 11 mil, no Varjão, e de até R$ 30 mil, no Lago Norte. Para ele, a falta de investimentos na rede e a má gestão causam problemas, como introdução de ar na tubulação, que prejudicam a medição dos hidrômetros. “Essas contas não podem representar o consumo mensal de uma residência. Por mais que a pessoa seja gastadora, há de se pensar em algum outro fator para essa anomalia”, duvidou. Ele propôs que a cobrança passe a considerar o número de pessoas por residência, para evitar que “famílias maiores sejam sobretaxadas”.
Também representante do Lago Norte, Suzana Pádua informou sobre um aumento superior a 400% entre junho e julho passados. “Minha conta chegou a R$ 1.800,00, sendo que nunca ultrapassava os R$ 400,00. Computamos aproximadamente 600 pessoas na mesma situação. Tenho vizinhos com conta de R$ 2.500,00 enquanto há pessoas, na mesma rua, que continuam pagando em torno de R$ 300,00”. Ela criticou o que considerou “falta de respeito pelos clientes” e pediu revisão da lei que alterou a tarifa.
O prefeito da região da Granja do Torto, Marcelo Oliveira, relatou que parte da comunidade “está desesperada” porque não pode pagar a conta da Caesb. “Aqui não é um bairro nobre. Pessoas que pagavam R$ 200,00 estão recebendo contas de até R$ 1.500,00. Na teoria é tudo muito bonito, mas a realidade é bem diferente”, comentou. Ele recomendou novas mudanças, para que a “população não seja penalizada”. A revisão da legislação também foi sugerida por Stella Castro, moradora do Lago Norte: “É justo tarifar pelo consumo, é justa a tarifa social, é correto cobrar mais de quem consome mais água, mas não neste patamar”.
O deputado Leandro Grass (Rede) discordou da proposta de privatização da Caesb, aventada durante o debate, pois, segundo ele, “dificultaria o controle social”. Grass propugnou um reexame urgente do modelo que considerou “equivocado” para o momento e insistiu na importância de um “planejamento urbano decente, responsável e sustentável”, bem como no fortalecimento da fiscalização. “Neste momento de pandemia, com tanta ocupação desordenada, grilagem de terras e tantas ligações clandestinas, sugiro aos gestores que o papel fiscalizador seja intensificado na estrutura de abastecimento, justamente, para que se verifique, de fato, o que é responsabilidade do consumidor e o que é responsabilidade da companhia”, ratificou.
Ao final, o presidente da Adasa considerou que não é padrão o índice de aumento apresentado pelos consumidores durante a audiência pública e garantiu que as denúncias estão sendo analisadas. Coordenador do debate, o deputado Reginaldo Sardinha lamentou a ausência de representantes da Caesb, o que classificou como “falta de delicadeza e respeito” à Câmara Legislativa. “Vou conversar ainda mais com os moradores e, se for conveniente, apresentarei um pedido de convocação do presidente da Caesb”, reforçou.