Secretaria de Segurança Pública lançará, em março, dispositivo eletrônico para acompanhar mulheres assistidas por medidas protetivas. Equipamento emitirá alertas ou acionará a polícia nos casos em que houver aproximação dos agressores
Por Redação*
No mês da mulher e a dois dias de a lei que tipifica o feminicídio completar seis anos, o Distrito Federal acumula casos de assassinato em decorrência de gênero. Desde a criação da qualificadora específica para esse tipo de crime — em 9 de março de 2015 — até o mês passado, o total de vítimas chegou a 116. Mesmo com uma queda de 46% nas ocorrências, entre 2019 e 2020, formas de preveni-las continuam entre as preocupações. Nesse sentido, a Secretaria de Segurança Pública (SSP-DF) lançará uma série de ações para integrar o projeto Mulher Mais Segura (leia Alianças sociais). Entre as medidas anunciadas está a implementação do Dispositivo de Monitoramento de Pessoas Protegidas (DMPP), previsto para começar a funcionar em março.
O sistema permitirá supervisionar vítimas de violência doméstica assistidas por medidas protetivas, para assegurar que os agressores não entrem em contato com elas. O DMPP será disponibilizado por meio de determinação judicial. As vítimas receberão um dispositivo móvel na cor roxa, e os acusados usarão tornozeleira eletrônica.
O secretário de Segurança Pública, Anderson Torres, afirma que o programa terá início com o atendimento a cinco mulheres. “Os dois dispositivos se conectam, de forma que nossos servidores poderão acompanhar, em tempo real, o cumprimento das medidas protetivas estabelecidas pelos juízes. Desse modo, a vítima não precisará acionar a polícia se estiver em situação de perigo. Se o agressor entrar na zona de exclusão determinada, ambos os dispositivos passam a vibrar, piscar a cor vermelha e emitir um alerta sonoro”, detalha.
Responsável pela Diretoria de Monitoramento de Pessoas Protegidas da SSP-DF, Andrea Boanova explica que o monitoramento das vítimas e agressores será feito por 15 servidores, como policiais civis, militares e penais, além de bombeiros. Atualmente, o setor conta com duas estações eletrônicas, com capacidade para acompanhar 600 indivíduos. “O software possibilita verificarmos quando a vítima está em perigo iminente e, assim, alertá-la. É o que se diferencia das medidas existentes, em que as mulheres precisam acionar a segurança pública”, compara. “O programa também viabiliza termos um rastro que altera nossa forma de atuação. Podemos ver, por exemplo, se a mulher está no shopping e se o agressor ingressa no local”, acrescenta.
A diretora ressalta que a vítima é informada sobre a situação e aconselhada a procurar um local seguro. “Ele (o agressor) pode não ter conhecimento de que a vítima está no estabelecimento, mas, pelas normas, ele deverá sair dali. Então, vamos orientá-lo a deixar o espaço, seja por SMS ou ligação. Se ele estiver indo até a mulher propositalmente, faremos as mesmas recomendações. Mas, ao mesmo tempo, será acionada a Polícia Militar, tanto para protegê-la quanto para deter o agressor”, frisa Andrea Boanova.
Confiança
Além disso, na Diretoria de Monitoramento de Pessoas Protegidas, que fica no Centro Integrado de Operações de Brasília (Ciob), as mulheres terão uma sala de acolhimento. Nesse local, as vítimas do projeto contarão, inclusive, com acompanhamento psicológico. “Haverá servidores capacitados para esse tipo de atendimento. Assim, elas poderão ser orientadas a buscar outros serviços de ajuda, como os disponibilizados pela Secretaria de Estado da Mulher, que é uma grande aliada no combate a esse tipo de violência”, comenta o secretário Anderson Torres.
Para Rita Lima, coordenadora do Núcleo de Defesa da Mulher (Nudem), da Defensoria Pública do Distrito Federal (DPDF), a implementação do DMPP pode gerar mais confiança para que as vítimas denunciem os agressores. “Nós que trabalhamos diretamente com essas mulheres nos deparamos com queixas sobre o controle da medida protetiva. Os próprios dados da Câmara Técnica de Monitoramento de Homicídios e Feminicídios da SSP-DF revelam que a maior parte das vítimas de feminicídio não denunciou situações de violência anterior. No ano passado, apenas uma tinha medida protetiva. Esse é um dos maiores desafios atuais para o combate a esse crime”, analisa.
A defensora pública frisa a necessidade de desmistificar a eficácia das medidas protetivas. “Quando a mulher recebe esse amparo da Justiça, a maior parte dos agressores respeita a norma estabelecida. Claro que não temos estrutura para acompanhar todas essas vítimas, mas, nos casos mais sensíveis e de grande vulnerabilidade, o dispositivo de monitoramento pode ser eficaz para assegurar o respeito às medidas protetivas e para manter a segurança da mulher. Além disso, mantém o agressor longe dos locais proibidos judicialmente, como a casa e trabalho da vítima, assim como evita encontros fortuitos em áreas públicas”, observa Rita.
Alianças sociais
O projeto Mulher Mais Segura integra o programa DF Mais Seguro — da Secretaria de Segurança Pública (SSP-DF), voltado para pautar a aplicação adequada de políticas nessas áreas durante os próximos dois anos. Entre as iniciativas, há a modernização e a ampliação do videomonitoramento nas regiões administrativas, por meio do programa Cidade da Segurança Pública; a melhoria no atendimento dos canais de emergência; a Operação Quinto Mandamento, para reprimir casos de homicídio; a manutenção do sistema de recompensas; e a Operação DF Livre de Carcaças.
No âmbito do Mulher Mais Segura, a SSP-DF promoverá cursos on-line para líderes religiosos do Distrito Federal. O acordo de cooperação integra a Aliança Distrital de Combate à Violência Doméstica. A primeira reunião do grupo ocorreu no mês passado, com 62 representantes de 24 instituições da capital.
O secretário de Segurança Pública Anderson Torres destaca a importância de a sociedade participar do combate à violência contra a mulher. “Às vezes, a vítima não procura imediatamente a polícia, mas busca o conselho de um líder espiritual, seja um padre ou pastor, por exemplo. Nosso objetivo, com o programa, é instruir essas pessoas a orientar as mulheres da melhor forma. Esse líder deve explicar onde a vítima pode buscar ajuda ante a situação e quais auxílios pedir para dar um basta a esse relacionamento”, diz o titular da pasta.
A defensora pública Rita Lima avalia a medida como uma ação indispensável ao enfrentamento dos crimes contra a mulher. “Não podemos focar somente em iniciativas de denúncias e punibilidade do autor. É importante tentarmos mudar a cultura machista e familista (que prioriza a família) em que a mulher é orientada a perdoar a situação de violência e a acreditar na mudança do companheiro”, finaliza Rita.
BSB TIMES [*Info: Sarah Peres/Correio Braziliense]