Postagem para promover liderança do Brasil no Brics exibe regiões ucranianas em disputa sob as cores da bandeira da Rússia
Uma publicação feita neste domingo (7) pelo perfil oficial do governo federal brasileiro (@GovBr) nas redes sociais causou controvérsia internacional ao exibir, em um vídeo promocional da Cúpula do Brics, territórios ucranianos ocupados pela Rússia como se já estivessem integrados ao país de Vladimir Putin.
A peça audiovisual, que busca destacar a participação e a liderança do Brasil no bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul — além dos novos integrantes, como Irã, Egito e Etiópia —, apresenta um mapa com as regiões do leste e do sul da Ucrânia pintadas com as cores da bandeira russa (vermelho, azul e branco). As áreas destacadas incluem Donetsk, Luhansk e as redondezas de Kharkiv — esta última nunca capturada pelas tropas russas, apesar dos bombardeios intensos desde 2022.
A representação gerou reações imediatas nas redes sociais e levantou questionamentos sobre o posicionamento do governo brasileiro em relação à guerra na Ucrânia. Para críticos, a escolha da imagem poderia ser interpretada como um endosso tácito à tentativa de anexação das regiões ucranianas pela Rússia.
“Trata-se de um grave erro diplomático ou de um gesto político velado”, criticou um analista internacional ouvido pela CNN. “Um vídeo institucional de governo deve ser cuidadosamente revisado, especialmente quando envolve zonas de conflito ativas.”
Kharkiv nunca foi conquistada
A cidade de Kharkiv, ao norte da Ucrânia, permanece sob controle ucraniano desde o início da guerra. Embora as Forças Armadas russas tenham tentado diversas ofensivas para tomá-la, inclusive com avanços pelo norte e nordeste, a resistência ucraniana manteve o domínio da segunda maior cidade do país.
Silêncio do Itamaraty e da Secom
Até o momento, nem o Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty) nem a Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom) se manifestaram sobre o vídeo. A CNN informou ter procurado ambos os órgãos e aguarda resposta oficial.
A publicação reacende o debate sobre a política externa brasileira em relação ao conflito no Leste Europeu. Desde o início da guerra, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vem buscando se colocar como uma voz de equilíbrio, propondo a construção de uma mesa de negociação entre os países envolvidos. No entanto, sua postura crítica a Volodymyr Zelensky e as falas dúbias sobre as responsabilidades da guerra já haviam provocado desconforto em Kiev e nos países da OTAN.
Postura ambígua e tensão com Zelensky
A relação entre Lula e o presidente ucraniano foi abalada logo nos primeiros meses do atual mandato do petista, após um encontro frustrado em uma reunião internacional, em que ambos divergiram sobre o papel do Brasil no conflito. Desde então, Lula adotou um tom mais próximo do discurso de “não alinhamento”, mas frequentemente foi acusado de se inclinar a favor da Rússia.
Durante a Cúpula do Brics, o presidente brasileiro voltou a defender a “pacificação” entre os países, mas não citou diretamente a integridade territorial da Ucrânia, algo considerado crucial pela diplomacia ocidental para qualquer plano de paz viável. Em junho deste ano, ao ser questionado sobre as exigências russas, Lula afirmou que “na guerra, nem sempre acontece o que a gente quer” — frase que também foi interpretada como um aceno ao Kremlin.
Críticas e impacto diplomático
Especialistas alertam que a exibição de mapas com regiões em disputa marcadas com as cores de um país ocupante pode comprometer a imagem do Brasil como agente de mediação neutro. Além disso, reforça percepções de que o governo brasileiro tem dificuldades em se alinhar com valores internacionais claros, como a defesa da soberania e das fronteiras reconhecidas pela ONU.
A crise gerada pelo vídeo se soma a outras polêmicas envolvendo a comunicação institucional do governo, que tem sido alvo de críticas tanto por falhas técnicas quanto por mensagens mal interpretadas em temas sensíveis.
Enquanto isso, os soldados russos continuam pressionando as fronteiras de Kharkiv, sem sucesso até agora, e o mapa do vídeo do @GovBr permanece publicado, sem qualquer retratação pública.
Resta saber se o governo brasileiro corrigirá a postagem ou manterá o conteúdo, correndo o risco de tensionar ainda mais sua posição no xadrez diplomático da guerra que já dura mais de três anos.






